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  • Arauz & Advogados

A Problemática sobre a Necessidade de Negociação Coletiva Para a Dispensa Coletiva

Por Fernanda Luszcynski, advogados do Setor Trabalhista em Araúz Advogados.


No intuito de abordar o tema da obrigatoriedade ou não de negociação coletiva para dispensa coletiva de trabalhadores, é importante partir da premissa de que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, inciso I, protegeu a relação de emprego contra dispensa arbitrária ou sem justa causa, e determinou que fosse criada uma lei complementar para estabelecer as especificidades das dispensas, regulamentar suas limitações e determinar indenizações compensatórias. Todavia, jamais foi editada a aludida lei complementar.


O Legislador Constituinte, ciente da morosidade para a criação da referida lei, estabeleceu no art. 10, do ADCT, que enquanto não haja a criação da lei para regulamentar o disposto no art. 7º, inciso I, da CF, fosse paga uma indenização correspondente a 40% sobre os depósitos relativos ao FGTS, nos casos de dispensa imotivada ou arbitrária. E ainda, acrescentou a vedação da dispensa arbitrária ou sem justa causa da gestante, contados da confirmação da gravidez até os cinco meses após o parto e, do membro da CIPA, do registro da candidatura até completar um ano após o mandato.


No decorrer dos anos, em que pese não haver qualquer previsão na legislação brasileira, a doutrina e a jurisprudência construíram o entendimento de que a dispensa coletiva somente poderia ocorrer se houvesse uma negociação coletiva prévia, sob o argumento de que a CF em seu art. 7, garantiu proteção ao trabalho contra dispensa arbitrária ou sem justa causa.


Assim, alguns posicionamentos passaram a ser adotados pelos Tribunais Trabalhistas, os quais entenderam pela declaração de nulidade das dispensas coletivas nos casos em que não há negociação prévia com o Sindicato da Categoria Econômica, determinando, consequentemente, a reintegração de todos os trabalhadores e a condenação das empresas ao pagamento de salários e demais direitos garantidos constitucionalmente durante todo o período de afastamento.


Entretanto, há de se considerar que, nos casos em que o Constituinte tratou de observar a necessidade de uma proteção mais específica, fez expressa previsão, conforme art. 10 supramencionado. Significa dizer que o Constituinte não fez qualquer previsão sobre a necessidade de negociação prévia da entidade sindical com relação as despedidas coletivas, ou seja, inexiste qualquer ressalva ou requisito para a dispensa em massa de trabalhadores.


De modo que, ao estabelecer a premissa de que a negociação coletiva é imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores, cria-se, com isso, ao nosso ver, uma nova regra, um novo pressuposto de validade para dispensa coletiva mediante intervenção sindical; gerando o questionamento sobre o cumprimento ou não do princípio constitucional da legalidade disposto no inciso II do art. 5º da CF, de que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.


Tal entendimento gera dúvidas e incertezas aos operadores de direito ante a instabilidade de decisões judiciais conflitantes, como também cria receio às empresas de realizar a dispensa de funcionários, pois sequer há previsão sobre a obrigatoriedade de uma negociação coletiva, bem como quais seriam os requisitos e alcance desta. Ora, não há sequer certeza se a referida negociação seria tão somente uma tentativa de negociar um acordo com o sindicato ou seria necessário haver o efetivo acordo para ser considerada lícita a dispensa coletiva.


Além disso, também não há nenhuma previsão normativa que determine qualquer penalidade no caso de seu suposto descumprimento, apesar de que, como dito acima, os Tribunais mesmo sem previsão legislativa, consideram nula a dispensa coletiva que não tenha a prévia negociação sindical.


Diante da insegurança jurídica, por não haver qualquer determinação sobre a demissão em massa em nossa legislação, em 2017, com o advento da Reforma Trabalhista pela lei 13.467/17, inseriu-se o art. 477-A na CLT, o qual, literal e textualmente, afastou o ativismo judicial e determinou expressamente a não obrigatoriedade de autorização do sindicato da categoria, prevalecendo, assim, o direito potestativo do empregador para dispensar imotivadamente, seja ela coletiva, individual ou plúrima, sem a necessidade de prévia negociação coletiva.


Ou seja, o Legislador assegurou o direito do empregador de dispensar imotivadamente o trabalhador, como um ato unilateral, sem que haja anuência do empregado, quiçá da entidade profissional, gerando, em contrapartida, o dever de arcar com os encargos trabalhistas advindos da dispensa imotivada.


Todavia, surgiram diversas outras dúvidas, visto que a legislação foi omissa em diferentes pontos. Vale destacar a ausência de conceito e distinção entre dispensa coletiva e dispensa plúrima, bem como a evidente falta de critérios utilizados para caracterizar uma dispensa coletiva. Outrossim, sequer há determinação do lapso temporal, tampouco sobre os procedimentos administrativos que devem ser adotados, como condição de sua validade.


Ante a inexistência de parâmetros, surgiram novos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais para tentar conceituar e estabelecer uma diferenciação entre a dispensa coletiva e dispensa plúrima.


Fixou-se entendimento de que a dispensa coletiva ocorre quando há uma dispensa de uma única vez/conjunta ou de pequeno lapso temporal de trabalhadores indeterminados de um mesmo empregador em razão do mesmo motivo justificador, de modo que o critério quantidade é desprezível, mas há um impedimento de novas contratações para substituí-los.


Já a dispensa plúrima se caracteriza quando há uma sequência de desligamentos singulares de empregados determinados em razão particular de cada trabalhador dispensado, podendo aqui, haver novas contratações de empregados.


Imprescindível, também, registrar que o Supremo Tribunal Federal (STF), em 19 de maio de 2021 iniciou o julgamento do Recurso Extraordinário sob nº 999.435, com repercussão geral reconhecida, de tema 638, ante o relevante impacto à economia nacional, o qual se debate sobre a necessidade ou não de prévia negociação coletiva sindical para autorizar a dispensa em massa de trabalhadores.


Em breve síntese, os Sindicatos dos Trabalhadores e outros ajuizaram Ação de Dissídio Coletivo em face das empresas Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Embraer e Eleb Equipamentos Ltda, com o objetivo de ver declarada a suspensão das dispensas de mais de 4 mil funcionários promovidas pela empresa Embraer ocorrida em 2009, sob o argumento de haver a necessidade de negociação prévia com a entidade sindical.


Por outro lado, a Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Embraer e Eleb Equipamentos Ltda, alegaram a validade da dispensa, diante da crise econômica vivenciada à época e que a legislação não prevê a obrigatoriedade de realizar negociação coletiva prévia para despedida coletiva.


O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou parcialmente procedente o dissídio, em suma, para reconhecer a abusividade da demissão coletiva, por ausência de negociação.


Após apresentados Recursos, a Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho (TST) entendeu ser imprescindível a prévia negociação coletiva quando visar a dispensa em massa de trabalhadores, contudo, apenas para os casos futuros, e afastou a declaração de abusividade das dispensas coletivas. Ou seja, foi dada validade as dispensas ocorridas em 2009 pela empresa Embraer, não havendo a necessidade de reintegração dos trabalhadores demitidos.


De modo que as partes interpuseram Recurso Extraordinário ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o referido acórdão do TST, mas nenhum dos recursos foram admitidos. Todavia, as empresas EMBRAER e ELER interpuseram agravo regimental, o qual foi reconsiderado pelo Relator por entender haver repercussão geral, de modo que o RE foi admitido pelo STF. Convém, portanto, destacar alguns trechos relevantes sobre os votos apresentados durante o julgamento.


Para o Relator, Ministro Marco Aurélio Mello, não há proibição ou condição para a dispensa coletiva, tanto que a rescisão disciplinada no art. 477-A da CLT, trata como sendo um ato unilateral, de modo que não deve se exigir qualquer concordância a outra parte, tampouco do sindicato. Assim, votou pela desnecessidade de negociação coletiva para a dispensa em massa de trabalhadores. Entendimento que foi acompanhado pelos Ministros Alexandre de Moraes e Nunes Marques.


Por sua vez, o Ministro Edson Fachin instaurou a divergência, o qual entendeu pela obrigatoriedade da negociação coletivo prévia para a dispensa em massa de trabalhadores, fundamentou que nas relações de trabalho, deve ser observada os princípios constitucionais, e foi acompanhado pelo ministro Roberto Barroso.


No entanto, o julgamento do tema 638, com repercussão geral, está suspenso, ante o pedido de vistas dos autos pelo Ministro Dias Toffoli, e o novo julgamento estava previsto para o dia 02 de fevereiro de 2022, mas até então não houve o julgamento. E enquanto o julgamento se prorroga no tempo junto ao STF, também não haverá nenhuma solução contra milhares de decisões conflitantes que geram insegurança jurídica, ainda que o Legislador já tenha previsto em seu art. 477-A da CLT pela não necessidade de negociação prévia diante de dispensa coletiva.


Diante desse cenário, causado pela morosidade e a imprevisibilidade das decisões judiciais, trouxe também grandes consequências prejudiciais à estabilidade da economia e o desenvolvimento nacional, afastando investidores que gerariam riquezas e crescimento econômico para o Brasil, em razão do medo e insegurança no caso de uma situação de crise financeira e que empresas não consigam se manter no mercado, sendo obrigados a realizar o encerramento de suas atividades, nestes casos, não há qualquer segurança jurídica resguardando o direito a elas de haver demissão em massa de trabalhadores sem que haja proposituras de futuras ações.


Devemos, assim, aguardar a decisão do Supremo, a qual possui efeito erga omnes e, deverá garantir maior segurança jurídica, pacificar a interpretação constitucional e uniformizar os julgados sobre o tema aqui abordado.

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