Por Graziella de Miranda Cabral da Rosa, advogada da Área Trabalhista do Araúz

A Portaria nº 1.419/2024 do Ministério do Trabalho e Emprego traz uma nova exigência para as empresas: o monitoramento e a gestão dos riscos psicossociais. Embora o tema já esteja presente em diversas normativas, essa é a primeira vez que sua inclusão se torna obrigatória nos documentos ambientais das organizações.
Inicialmente se faz importante definir o que são os riscos psicossociais, que para o Governo podem ser definidos da seguinte forma[1]:
Riscos psicossociais estão relacionados à organização do trabalho e às interações interpessoais no ambiente laboral. Eles incluem fatores como metas excessivas, jornadas extensas, ausência de suporte, assédio moral, conflitos interpessoais e falta de autonomia no trabalho. Esses fatores podem causar estresse, ansiedade, depressão e outros problemas de saúde mental nos trabalhadores.
Um estudo realizado pelo Observatório de Segurança e Saúde do Trabalho, no Brasil, entre os anos de 2012 a 2022 os transtornos mentais e comportamentais são a terceira maior causa de afastamento do trabalho na espécie previdenciária e a quinta maior causa na espécie acidentária, ou seja, relacionada ao trabalho desenvolvido.[2]
Em que pese a inclusão explícita na norma dos riscos psicossociais só tenha ocorrido no ano de 2024, o tema da saúde mental dos trabalhadores vem sendo discutido amplamente nos últimos anos.
Nos anos recentes a discussão sobre a Síndrome do Burnout (doença emocional que tem origem no estresse crônico relacionado ao trabalho), culminou na inclusão desta na 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças, em janeiro de 2022.
Em setembro de 2022, entrou em vigor o Programa Emprega + Mulheres, que tem entre seus objetivos a promoção de um ambiente laboral saudável, com medidas de prevenção e combate à violência no trabalho.
No ano de 2023, o Ministério da Saúde atualizou a lista de doenças relacionadas ao trabalho (LDTR) para incluir questões de saúde mental (Portaria GM/MS nº 1999/2023). Incluindo na Lista A, Parte V, os agentes e/ou Fatores de Risco Psicossociais no Trabalho (Anexo I do presente parecer).
A referida lista destaca os principais agentes/fatores de risco: (i) gestão organizacional; (ii) características das relações sociais no trabalho; (iii) condições do ambiente de trabalho; (iv) interação pessoa-tarefa; (v) jornada de trabalho; (v) violência e assédio moral/sexual; (vi) discriminação; e (vii) risco de morte ou trauma no trabalho.
Ainda, em março de 2024, foi promulgada a Lei 14.831, de 27 de março de 2024, que instituiu o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental, que será concedido às empresas que cumprirem critérios rigorosos para a promoção da saúde mental e bem-estar dos trabalhadores.
É fundamental observar que que a alteração da NR-01 se alinha com as demais mudanças de diretrizes no âmbito nacional e no âmbito internacional, com as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que desde os anos 1980 reconhecem os impactos dos fatores psicossociais no ambiente de trabalho.
Assim, resta claro que a alteração da NR-01 está alinhada com o cenário internacional e as leis e normativas existentes em âmbito nacional. Ainda assim, o processo de alteração da NR-01 para inclusão dos riscos psicossociais foi marcado por divergências na Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP), destacando-se que os representantes das empresas se posicionaram pela não inclusão dos riscos psicossociais no texto da Norma Regulamentadora 1.
No entanto, ocorrendo o apoio pela representação dos trabalhadores e do governo, o Ministério do Trabalho e Emprego decidiu pela inclusão, resultando então na edição da Portaria MTE nº 1.419, publicada em 27 de agosto de 2024.
A Portaria menciona os riscos psicossociais em 3 itens diferentes (1.5.3.1.4. 1.5.3.2.1 e 1.5.4.4.5.3), além de ser previsto nas NR’s 17, 33 e 35.
Vale ressaltar que até o presente momento inexiste qualquer regulamentação com uma definição clara e precisa do que deverá ser abordado e considerado nas avaliações de risco e quais os limites, principalmente para fins de fiscalização.
É importante considerar, também, que diversas decisões judiciais já reconhecem os riscos psicossociais como fatores diretamente relacionados ao trabalho, especialmente em casos envolvendo assédio moral, carga excessiva de trabalho, pressão psicológica desproporcional e precarização das condições laborais.
Assim, ainda que não haja precedentes sobre a nova exigência normativa, a jurisprudência trabalhista já sinaliza a tendência de reconhecimento da relevância dos riscos psicossociais na esfera ocupacional.
Ainda que, até a data de publicação do presente artigo, não exista definição exata dos parâmetros que serão adotados pelo Ministério do Trabalho e Emprego para avaliação e fiscalização, é importante que as empresas adotem uma postura proativa na implementação de medidas preventivas e de gestão dos riscos psicossociais. Isso inclui a incorporação de políticas de saúde mental no ambiente de trabalho, a realização de avaliações periódicas de riscos organizacionais, o treinamento de lideranças e a criação de canais internos de escuta e acolhimento.
Se espera que, até a data de entrada em vigor da norma (25/05/2025), a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) expeça uma nota técnica abordando detalhes sobre a avaliação dos riscos psicossociais e quais os parâmetros e critérios a serem utilizados e abordados em eventuais fiscalizações.
A adoção de uma abordagem integrada de gestão de riscos, incluindo os psicossociais, não apenas contribui para a conformidade com as normas regulamentadoras, mas também promove um ambiente de trabalho mais saudável, produtivo seguro para empresas e trabalhadores.
O descumprimento da Portaria nº 1.419/2024 pode gerar riscos significativos para as empresas, incluindo multas e ações trabalhistas, além de aumento de afastamentos e perda de produtividade. O impacto vai além das sanções legais, afetando a reputação e a sustentabilidade do negócio.
Por isso, adotar uma gestão preventiva dos riscos psicossociais é essencial não só para a conformidade, mas para a segurança jurídica e a saúde financeira da empresa.
REFERÊNCIAS
Comments