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A Sucessão Processual Como Alternativa À Desconsideração Da Personalidade Jurídica

Por Mariana Rodrigues, Advogada do setor de Direito Internacional em Araúz & Advogados Associados




A satisfação do crédito demanda o emprego de inúmeros meios e alternativas processuais para localização de bens dos devedores. Tratando-se de empresa devedora e preenchidos os requisitos previstos no Art. 50 do Código Civil, a desconsideração da personalidade jurídica figura como alternativa viável para o direcionamento da execução aos sócios da empresa devedora.


Ressalta-se que a Medida Provisória nº 881/2019, de 30 de abril de 2019, alterou e complementou o Art. 50 do Código Civil ao caracterizar o desvio de finalidade como a utilização dolosa da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores, bem como, pela utilização da pessoa jurídica para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza, nos termos dos §1º e §2º do referido artigo:


Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.


Ocorre que inúmeros credores deparam-se com o encerramento da empresa sem a devida quitação dos valores devidos ou até mesmo com o encerramento da empresa no trâmite da execução. Diante disso, costumeiramente, como alternativa ao prosseguimento da execução, utiliza-se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica fundamentado no enceramento da empresa.


A instauração o incidente observa o procedimento previsto Art. 133 do Código de Processo Civil, no qual o amplo contraditório e a oportunidade de ampla instrução probatória tornam a desconsideração da personalidade jurídica alternativa menos célere e muitas vezes onerosa.


Ocorre que em muitos casos a extinção da empresa não é reconhecida como utilização abusiva da pessoa jurídica, deixando de ser acolhida como fundamento à desconsideração da personalidade jurídica.


Nestes casos, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, decorrente do Recurso Especial nº 1784032/SP julgado em 02/04/2019 e de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze[1], passou a ser adotado por inúmeros tribunais brasileiros, apresentando aos credores alternativa célere e menos onerosa para alcançar o patrimônio dos sócios.


No julgamento do Recurso Especial nº 1784032 SP entendeu-se que a extinção da pessoa jurídica se equipara à morte da pessoa natural, prevista no art. 110 do Código de Processo Civil, atraindo a sucessão material e processual, com atenção ao tipo societário e a gradação da responsabilidade pessoal dos sócios.


Assim, a questão passa a ser analisada à luz da sucessão material e processual, possibilitando a responsabilização dos sócios e seu patrimônio pessoal por débito remanescente de titularidade de sociedade extinta.


Diante disso, comprovada a extinção da pessoa jurídica devedora mediante distrato arquivado na Junta Comercial, tem-se a hipótese de sucessão processual que afasta a necessidade de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, garantindo celeridade ao prosseguimento da execução.


À luz desse entendimento, quando verificada a extinção da empresa, a desconsideração da personalidade jurídica não é via cabível para promover a inclusão dos sócios em demanda judicial da qual a sociedade empresária era parte legítima.


O entendimento do Superior Tribunal de Justiça passou a ser utilizado em inúmeros tribunais, especialmente no Tribunal de Justiça do Paraná a partir no ano de 2020, consolidando-se nos tribunais brasileiros. [2].


Diante disso, a sucessão-processual de empresa extinta possibilita o redirecionamento da execução aos sócios sem a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, permitindo a inclusão dos sócios no polo passivo de maneira mais célere e menos onerosa ao credor.



[1] RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROFERIDA CONTRA SOCIEDADE LIMITADA. 1. DISTRATO DA PESSOA JURÍDICA. EQUIPARAÇÃO À MORTE DA PESSOA NATURAL. SUCESSÃO DOS SÓCIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 43 DO CPC/1973. TEMPERAMENTOS CONFORME TIPO SOCIETÁRIO. 2. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. FORMA INADEQUADA. PROCEDIMENTO DE HABILITAÇÃO. INOBSERVÂNCIA. 3. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Debate-se a sucessão material e processual de parte, viabilizada por meio da desconsideração da pessoa jurídica, para responsabilizar os sócios e seu patrimônio pessoal por débito remanescente de titularidade de sociedade extinta pelo distrato. 2. A extinção da pessoa jurídica se equipara à morte da pessoa natural, prevista no art. 43 do CPC/1973 (art. 110 do CPC/2015), atraindo a sucessão material e processual com os temperamentos próprios do tipo societário e da gradação da responsabilidade pessoal dos sócios. 3. Em sociedades de responsabilidade limitada, após integralizado o capital social, os sócios não respondem com seu patrimônio pessoal pelas dívidas titularizadas pela sociedade, de modo que o deferimento da sucessão dependerá intrinsecamente da demonstração de existência de patrimônio líquido positivo e de sua efetiva distribuição entre seus sócios. 4. A demonstração da existência de fundamento jurídico para a sucessão da empresa extinta pelos seus sócios poderá ser objeto de controvérsia a ser apurada no procedimento de habilitação (art. 1.055 do CPC/1973 e 687 do CPC/2015), aplicável por analogia à extinção de empresas no curso de processo judicial. 5. A desconsideração da personalidade jurídica não é, portanto, via cabível para promover a inclusão dos sócios em demanda judicial, da qual a sociedade era parte legítima, sendo medida excepcional para os casos em que verificada a utilização abusiva da pessoa jurídica. 6. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1784032 SP 2018/0321900-4, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 02/04/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/04/2019 REVPRO vol. 295 p. 460)

[2]AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REVISIONAL DE ALUGUEL. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. LIQUIDAÇÃO VOLUNTÁRIA DA PESSOA JURÍDICA EXECUTADA. DISTRATO SOCIAL. EXTINÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SUBSTITUIÇÃO PELOS EX-SÓCIOS NO POLO PASSIVO. EXIGÊNCIA DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE EM APARTADO PARA O RECONHECIMENTO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DECISÃO EQUIVOCADA. SIMPLES SUCESSÃO PROCESSUAL. RESPONSABILIDADE ILIMITADA DOS SÓCIOS ASSUMIDA EM DISTRATO SOCIAL. DECISÃO REFORMADA. 1. A substituição processual no polo passivo em decorrência da extinção da personalidade jurídica da parte executada não se confunde com o incidente de desconsideração de personalidade jurídica (art. 133 - 137/CPC), devendo observar-se a norma contida nos arts. 313, I , 688, I, e 689, do Código de Processo Civil, por analogia. 2. Com a extinção da personalidade jurídica da sociedade executada e consequente extinção de sua capacidade processual, por força de distrato social, deve ser admita a sucessão processual com a inclusão dos ex-sócios no polo passivo do feito, em fase de cumprimento de sentença, os quais sócios assumiram a responsabilidade pelas obrigações da extinta sociedade. 3.. Agravo de Instrumento à que se dá provimento. (TJPR - 17ª C. Cível - 0061296-41.2019.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: Juiz Francisco Carlos Jorge - J. 23.07.2020) AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - AGRAVANTE - POSTULAÇÃO -PEDIDO DE SUCESSÃO PROCESSUAL DA EXECUTADA - JUÍZO - INDEFERIMENTO - EXECUTADA - PESSOA JURÍDICA - EXTINÇÃO VOLUNTÁRIA - SUCESSÃO PROCESSUAL - POSSIBILIDADE - EXEGESE DO ART. 110 DO CPC - INCLUSÃO DOS SÓCIOS NO POLO PASSIVO - PERTINÊNCIA - DECISÃO COMBATIDA - REFORMA. agravo DE INSTRUMENTO provido. (TJ-SP - AI: 20172126820218260000 SP 2017212-68.2021.8.26.0000, Relator: Tavares de Almeida, Data de Julgamento: 12/03/2021, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/03/2021) AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU A INCLUSÃO DA PESSOA JURÍDICA NO POLO PASSIVO DA DEMANDA, DETERMINANDO A INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA EM AUTOS APARTADOS. INSURGÊNCIA DA EXEQUENTE. ACOLHIMENTO. PESSOA JURÍDICA DEVEDORA QUE NÃO MAIS SUBSISTE NO MUNDO FÁTICO. INCORPORAÇÃO COMPROVADA (ARTS. 227 DA LEI Nº 6.404/76 E 1.116 DO CC). SUCESSÃO PROCESSUAL OBRIGATÓRIA. DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INSTITUTOS QUE NÃO SE CONFUNDEM. DECISÃO REFORMADA. SUCESSÃO PROCESSUAL AUTORIZADA. Agravo de instrumento conhecido e provido. (TJPR - 14ª C. Cível - 0059233-09.2020.8.16.0000 - Pinhais - Rel.: Desembargadora Themis de Almeida Furquim - J. 15.12.2020)

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